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Último dia - Vinícola Angheben

  Nosso último dia de viagem amanheceu quente e com céu limpo. Nosso voo estava marcado para as 17:30 em Porto Alegre e contratamos um motorista para nos pegar no hotel às 14 horas. Portanto, ainda tínhamos uma manhã de degustações pela frente.
  Quando fiz o roteiro de viagem, tinha programado visitar duas vinícolas próximas, que não necessitavam de agendamento e que eu não havia conseguido incluir nos dias anteriores, durante esse período. Mas, durante a nossa primeira visita da viagem, mudamos os planos. Enquanto tomávamos um espumante na cave do mestre Lona, ele nos perguntou se a Angheben estava no nosso roteiro. Confesso que, durante as minhas pesquisas, eu havia lido algo sobre ela mas, como são muitas, tivemos que fazer opções e ela não estava incluída. O sr. Lona falou que não poderíamos ir até o sul e deixar de visitar uma das melhores vinícolas em termos de qualidade. Carinhosamente, brincou que tínhamos que degustar o "delicioso vinagre balsâmico de Pinot Noir" produzido por eles. Com a indicação de quem mais entende do assunto, não pensei duas vezes. Mentalmente refiz todo o meu roteiro e decidi que as vinícolas do último dia ficariam para uma próxima visita. Ele, atencioso como sempre, enviou um e-mail para Eduardo Angheben, um dos proprietários e enólogo da vinícola, nos apresentando como um casal de amigos e pedindo que nos recebesse. Durante a semana, Eduardo me enviou um e-mail confirmando que nos receberia na terça pela manhã e nosso roteiro foi definitivamente alterado.
  Pra variar, chegamos mais cedo e ficamos fazendo hora no Moinho Graciema, uma grande loja que vende geleias de frutas e sucos produzidos por eles e também cervejas artesanais, além de outros produtos. A Angheben fica mais acima, em uma estradinha lateral e o Moinho é uma boa referência. Curiosamente, tanto o motorista que nos levou, como o que nos buscou, tiveram dificuldade de encontrar a vinícola.
  Eduardo e sua esposa, Fernanda, nos receberam calorosamente. A vinícola boutique é familiar, sendo os enólogos pai e filho. A produção é limitada a 15 a 20 mil garrafas ao ano. Dentro da vinícola, ao lado dos tanques de aço inox e das barricas de carvalho, foi montada a loja onde foram colocadas mesas para degustação. Eduardo nos explicou que, por se tratar de uma produção muito pequena, quase toda a venda acontece dentro da própria vinícola. Tivemos a oportunidade de degustar quase todos os rótulos, com exceção do varietal de Teroldego que já estava esgotado.
  Iniciamos com um varietal da minha uva branca predileta. O Angheben Gewürztraminer já me chamou a atenção na taça devido à sua cor quase translúcida, o que não é usual nos vinhos da casta. Muito aromático, com flores brancas, lichia e damasco seco, é leve, com sabores de frutas de caroço maduras e ótima acidez. Estilo muito diferente dos Gewürz da Alsácia, mais leve e delicado, mas com o caráter varietal da casta muito evidente.
  Em seguida foi a vez de degustar o famoso Pinot Noir indicado pelo mestre Lona. Um rótulo não safrado onde se predomina a safra de 2015 no corte, com menor percentual das safras de 2014 e 2013, o que contribuiu muito para a sua complexidade. Com aromas de frutas vermelhas e notas de especiarias, apresenta corpo médio pra leve, boa acidez e taninos finos e delicados. Realmente, um belo exemplar nacional de um varietal dessa uva tão temperamental.
  O próximo vinho, também não safrado, é um varietal de uma casta italiana pouco comum no Brasil. O Angheben Barbera também é um corte com predomínio da safra 2015, e percentuais menores de 2014 e 2013. Possui um nariz aromático, trazendo cerejas, framboesas e toques especiados. É frutado, com corpo médio, boa acidez e taninos macios. Segundo Eduardo, é considerado o queridinho da vinícola por críticos e formadores de opinião. Também me agradou bastante.
  Saindo da Itália, vamos agora degustar um varietal de uma uva portuguesa. O Touriga Nacional não safrado também é um corte de vinhos de várias safras. Com aromas de frutas negras, muito floral trazendo violetas e damas da noite, além de notas especiadas, é potente, encorpado, com alta acidez, taninos poderosos mas redondos e final amplo. Belíssimo!
  O Angheben Cabernet Sauvignon 2010 possui aromas de frutas negras, tostado, café e notas de hortelã. É encorpado, com sabores de chocolate e café se sobrepondo aos sabores de frutas negras e ao mentol, tem boa acidez, taninos potentes e macios e bom final de boca.
  O último tinto que Eduardo nos ofereceu foi o Angheben Tannat 2008. Diferente dos outros varietais de Tannat degustados no sul, este tem mais corpo e presença, mas bem mais elegante que a maioria dos Tannats Uruguaios. Com aromas de couro, madeira tostada, cacau, tabaco e um toque de frutas negras, é volumoso, encorpado, com boa acidez, taninos potentes e redondos e final longo. Um vinho que, na minha opinião, está no seu auge.
  Para brindar à nossa excelente degustação, Eduardo nos ofereceu o espumante Angheben Método Tradicional Brut, elaborado com 50% de Pinot Noir e 50% de Chardonnay e que ficou doze meses em contato com as borras. Possui uma perlage fina e persistente, aromas de maça verde e frutas cítricas com leves notas de panificação, é muito leve, com acidez refrescante e sabores frutados.
  Durante toda a degustação, Eduardo, muito atencioso, nos falava das características dos vinhos, do processo de produção e nos dava dicas de harmonização com cada um dos rótulos. Ao final, depois de escolhermos as garrafas que seriam despachadas para BH, ele nos ofereceu uma taça de um Tokaji Szamorodni, delicioso vinho de sobremesa húngaro que ele recebeu de presente de um cliente. A receptividade dos vinicultores do sul nos fez voltar pra casa já pensando na próxima visita.
  A nossa viagem acaba por aqui mas os assuntos sobre vinho continuam. Espero voltar em breve com novas estórias e curiosidades. Até um próximo texto!



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